Em novembro de 2009, recebi a graça de passar uma semana na Terra Santa. Juntamente com outros 150 bispos da América Latina, participei de um encontro de espiritualidade promovido pelo Caminho Neocatecumenal, que arcou também com as despesas da viagem. A convivência aconteceu no “Monte das Bem-Aventuranças”, ao lado do Lago de Tiberíades, na Galileia.
Para ser sincero, desde a primeira vez que lá estive, em 1990, devo dizer que não me senti muito atraído pelos “lugares santos”. Em dois deles, tidos como os mais importantes – a gruta de Belém e o Santo Sepulcro, em Jerusalém –, é tão intensa a afluência de turistas e tão visíveis as desavenças entre as confissões religiosas que supervisionam os templos, que é muito difícil concentrar-se e rezar. A mover os milhões de pessoas que circulam por Israel e pela Palestina parece ser muito mais a curiosidade do que a fé. Quanto a Jesus, ele continua sendo um ilustre desconhecido para não poucas pessoas.
Mas, não quero ser pessimista nem esmorecer a quem deseja viajar à Terra Santa. São inúmeras as pessoas que se converteram e se aproximaram de Deus ao fazerem essa pere-grinação. Saber que é uma terra escolhida por Deus para seu filho Jesus e que nela viveram centenas de milhares de patriarcas, profetas e santos faz dela um lugar único no mundo – e não apenas para judeus, muçulmanos e cristãos. Nesse sentido, posso dizer que foram ines-quecíveis os momentos que passei na Basílica de Nazaré, construída sobre a casa de Maria, e no Cenáculo, onde Jesus instituiu a Eucaristia e o Espírito Santo desceu sobre Nossa Se-nhora e os Apóstolos.
Passando do aspecto religioso para o social e econômico, preciso reconhecer que o progresso que encontrei em Israel superou qualquer minha expectativa. Apesar do solo pe-dregoso e da escassez de água, a transformação do território parece dizer que a “Terra Pro-metida” e o “Jardim do Éden” não são coisas do passado, mas do presente. É uma pena que o confronto entre judeus e palestinos ofusque o brilho desse desenvolvimento!
São Jerônimo transcorreu boa parte de sua vida em Belém, onde ainda se podem ver algumas ruínas do mosteiro que fundou. Escrevendo aos amigos de Roma, que o invejavam por residir na terra de Jesus, ele assim respondia: «Do que nos devemos felicitar não é de termos estado em Jerusalém, mas de termos vivido bem. Os cristãos são apreciados pelo mérito de sua fé e não pelo lugar que habitam. Os verdadeiros adoradores não precisam de Jerusalém ou do monte Garizim para adorar o Pai, pois “Deus é espírito” e os seus adoradores devem “adorá-lo em espírito e verdade”. Os lugares santos da cruz e da res-surreição só são úteis aos que levam a sua cruz e ressuscitam com Cristo cada dia. Quanto aos que dizem: “Templo do Senhor, templo do Senhor, templo do Senhor” (Jr 7,4), ouçam estas palavras do Apóstolo: “Vós é que sois o templo de Deus, se o Espírito Santo habita em vós” (1Cor 3,16). Não creio que falte alguma coisa à tua fé por não teres visto Jerusalém, nem eu me julgo melhor por habitar neste lugar. Mas, aqui ou ali, receberás igual recompensa, de acordo com as tuas obras diante de Deus».
Muito semelhante é a experiência de vida feita por Chiara Lubich: «Se escolhemos a Deus como ideal de vida – e essa é a nossa identidade –, se o colocamos em primeiro lugar, isso requer praticamente que coloquemos em primeiro lugar, em nosso coração a sua Pala-vra, a sua vontade. Ela deve emergir sobre tudo o mais. Diante dela, todas as outras coisas, de certo modo, devem tornar-se indiferentes, com aquela santa indiferença a que alguns santos se referem. Em nossa vida, não deve ter tanta importância, por exemplo, ser sadios ou doentes, estudar ou servir, dormir ou rezar, viver ou morrer. O importante é viver a Pa-lavra, ser Palavra viva».
Essa é a verdadeira Terra Santa. É nela que precisamos viver, aqui e agora. A outra, se um dia alguém tiver a graça de conhecer, agradeça a Deus. Mas, enquanto ela não chega, façamos nossas as palavras que um dia Deus dirigiu a Moisés: «Tira as sandálias dos teus pés, porque o lugar em que pisas, é uma terra santa!» (Ex 3,5). Feliz de quem consegue, a cada momento, desvencilhar-se de tudo o que o impede de servir os irmãos! Pois onde exis-te amor, ali nasce Jesus. E onde nasce Jesus, o tugúrio mais humilde se transforma numa Terra Santa!
Dom Redovino Rizzardo, cs
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