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Comerciante escreve sobre as condições da Unei de Dourados

06 agosto 2009 - 14h19

O Ministério Publico Estadual não pode fazer tudo sozinho. Em uma corajosa atuação, os Promotores de Justiça da Infância e dos Diretos Humanos de Dourados pediram a interdição da Unei (Unidade Educacional de Internação) de nossa cidade, que ao contrário de reeducar, vem transformando os adolescentes ali internados em verdadeiros monstros. Nas condições descritas pelos promotores, nenhum ser humano melhora ou aprende algo útil, ao contrário, as condições desumanas só promovem a revolta e a indignação, com a ajuda de uma sociedade hipócrita que prega o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), mas na prática aplica um inferno.

Você pode não concordar com o ECA, pode achar que a “pena” máxima prevista é pouco (três anos), pode achar que os adolescentes que cometeram crimes hediondos devem cumprir o mesmo tempo que um adulto, pode querer diminuir a idade penal para 16 anos, mas uma coisa não podemos esperar desses adolescentes, que saiam de uma unidade de internação como um cidadão honesto e produtivo, por que nas condições em que “vivem” isso é impossível, não só pra eles, mas para qualquer um.

Imagine um adolescente que roubou um tênis e foi preso e encaminhado à Unei, lá ele se depara com funcionários armados com todo tipo de ressentimento, funcionários que são agredidos todos os dias. Depois é encaminhado ao seu alojamento, que na verdade é uma cela, encontra então mais 10 adolescentes dormindo em 6 camas de concreto, infestadas de todo tipo de micose, na sua maioria adolescentes com o dobro do seu tamanho e reincidentes que cometeram todo tipo de crimes.
Chega a hora do almoço e a comida chega numa marmita de alumínio toda amassada e fria, a água tem que pedir, outra opção é tomar a do banheiro. Seus colegas te alertam “nem pense em reclamar”. De tarde vem a hora de tomar banho de sol, esse adolescente é levado para uma quadra de esporte, não pense que ele vai encontrar um professor esperando, vai sim, encontrar a PM na torre do muro, armado e torcendo pra alguém tentar fugir para testar sua munição. Depois de uma hora, volta para aquele inferno, chega a hora da janta, a mesma coisa do almoço, só um pouco mais gelado e a noite cai, e o adolescente olha para os lados e sente que não tem para onde ir, ou ele colabora com seus colegas ou vai apanhar a noite toda.

Imaginou a cena? Agora imagine que esse adolescente é o seu filho, ou o seu filho não é capaz de roubar um tênis, fumar um baseado, dirigir seu carro sem você saber, envolver-se numa briga... Sim, é possível, qualquer adolescente pode se envolver em algum ato ilícito e ir parar numa Unei, ou você é daqueles que bate no peito e diz “meu filho não”. Talvez seja até verdade, o dinheiro pode até tirar seu filho dessa situação, mas pode fazer com que ele, no decorrer da vida, encontre aquele adolescente que passou três anos dentro desse inferno, e quem sabe não será seu filho que vai pagar por nossa ignorância em não fazer nada agora.

Nós podemos e devemos ajudar toda e qualquer autoridade que está tentando dar a esses adolescentes as mínimas condições, e não estou falando de um restaurante, de uma cama aquecida ou um banheiro limpo, estou falando de uma instalação minimamente adequada, de profissionais que possam ajudar ele entender que nada cai do céu, mas que existe uma outra alternativa pra ele. Quem sabe em alguma coisa que ele goste de fazer, e não estou falando do repugnante trabalho de artesanato que só estigmatiza a sua condição de presidiário, e sim de um curso profissionalizante do senai, uma formação educacional que permita a ele ter a opção de tentar um vestibular. Alguns vão conseguir passar, outros não, mas e daí? A vida é assim mesmo, ou todos os filhos são brilhantes?

É patente que a sociedade, o povo, não quer nem ler algo assim, quanto mais participar de alguma discussão a respeito, mas existem pessoas que ocupam posição de destaque nesta sociedade, posição essa que, ao contrário do que muitos pensam, não é para usufruir dela ou criar um conto de fadas. Quando um de nós ocupa essa posição, nos é entregue a responsabilidade de provocar essas discussões. Um vereador, presidentes e membros de conselhos, presidente e membros da OAB, proprietários de jornais, padre, pastores, bispos, membros da dita sociedade civil organizada.

Temos que ter a coragem de enfrentar esse e outros problemas, não podemos mais deixar nas mãos das pessoas que elegemos, mesmo por que a Democracia não é assim, “vote e vá dormir tranqüilo”. Se alguém ler esse texto e pensar “isso não é comigo”, está redondamente enganado, durante a vida o seu filho também será o meu filho e o meu filho será o seu filho, vivemos em sociedade. Precisamos urgentemente entender que viver civilizadamente é muito mais que ir a um baile ou no churrasco na casa do amigo. Temos mania de afastar de nós e de nossas famílias esse tipo problema, mas não temos mais como afastar. Pergunte para alguém que foi assaltado por um menino de 14 anos, pergunte para alguém que foi seqüestrado por um garoto que queria comprar drogas, você não vai precisar ir longe para achar alguém que passou por isso.

"O que mais preocupa não é nem o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons."
Martin Luther King






Marcio de Jesus Gonçalves
Comerciante em Dourados
Ex-Coordenador de Medidas Socioeducativas
marcio.claudia@hotmail.com

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